domingo, 27 de março de 2016

Fio da meada


     Antes de sair de casa ela pegou a chave sobre a estante e por um momento parou e mirou o porta retrato da família. Sua bisavó ao centro, seu avô e sua avó, sua mãe e sua tia, ela mesma com as duas irmãs e sua única prima. O lado alemão da família na imagem. Provavelmente quem batera a foto fora seu pai. Todos muito sérios, postura ereta. Um jardim verde ao fundo. Nenhum esboço de sorriso, um ar orgulhoso predomina nas faces concentradas.
     Pegou a chave e saiu para dar uma caminhada.
     Passando pelo jardim ela viu um aviso de não pise na grama. Jardim bonito, bem cuidado. Parou onde indicava a placa e admirou o lago e as vitórias régias. O brilho da água, é céu azul. Sentiu a pele quente, apesar de ser início de outono fazia  calor. Uma gota de suor escorreu pela coluna até tocar o cós do short verde.
    Não sabe quanto tempo permaneceu ali parada.
    Pensou na filha, no marido. Sentimentos bons. Sentiu saudade da sua mãe e de suas irmãs, distância dura. Lembrou dos sobrinhos que cresciam lá longe. Pensou em tudo que aprendiam, todos os dias.
    Uma garça pousou muito próximo dela. Perfeitamente branca, perfeitamente aerodinâmica. Linda!
    As árvores se moviam lentamente com uma leve brisa.
    Um grupo de  pessoas se aproximou, falavam alto e riam muito. Gargalhadas e gestos. Ruído. Pisaram na grama e foram até a beira da água.
    Ela deu um suspiro.
    Chegaram três crianças e imitaram os adultos. Vários sapatos, de vários tamanhos pisoteavam a grama verde, ao lado da placa que pedia para não pisar na grama.
    A garça se foi. Ela se virou e caminhou para longe, uma ponta de irritação a acompanhava agora em sua caminhada.
    'No Brasil alegria e diversão justificam falta de educação. Tanta coisa justifica tanta coisa que se perde o fio da meada. Basta um sorriso e um tapinha nas costas.'
     Ela sentiu uma saudade ainda maior da sua família.

 

   
   

   

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