domingo, 3 de abril de 2016

espelho


    Aos vinte e um anos estava sentada na sala de casa com sua filha recém nascida no colo. Os minúsculos olhinhos se abriram. Cheirou o cabelinho, passou o nariz na pele macia da bochecha. 'Somos nós duas agora pequenina, eu vou dar conta, você vai ter que confiar em mim'. Ela confiou, nunca houve dúvidas entre as duas. 
    Desde pequena aquele bebê olhava para ela muito séria, como se já soubesse das coisas da vida. Olhava muito desconfiada para as pessoas que não conhecia. Não ria com bilu-bilu. Quase não dormia. Sua mãe nunca ouvira falar de um bebê de três meses que dorme às onze, acorda às seis e não cochila de tarde, nada. Aquela pequena criatura estava sempre ligada em tudo, com sua carinha séria desconfiada. No entanto, quando sua mãe dizia 'pula que eu te pego', ela pulava sem pestanejar.
    Cresceu muito rápido, rápido demais na opinião da mãe. 
     A confiança entre as duas só aumentou. Para elas não existe amor automático, precisa admiração, e uma tenta merecer a admiração da outra.
      Hoje ela tem a idade que a mãe tinha quando engravidou.
    Um dia, ao longo dessa história, alguém comentou com a filha: 'você não parece nada com a sua mãe'. Ela respondeu: 'talvez não por fora, mas por dentro eu sou praticamente um espelho dela'. 
    Espelho feito de amor, de admiração, em que não se sabe quem é reflexo, quem aprende com quem. 
      A filha não tem a mesma profissão da mãe, nem engravidou na mesma época, nem lida com os problemas da mesma forma. E ainda assim ali está o espelho, que só as duas vêem. O espelho sutil dos valores.

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